terça-feira, julho 18, 2006

PRAÇA ROOSEVELT OU BUENOS AIRES

Quando um corpo cai, o som é oco, falta algo. Talvez ali, naquele instante que precede o impacto, a angústia já previna e a alma se desprenda espantada antes mesmo do fim, quando deixa de existir, pois o corpo está lá, se assim podemos chamá-lo.
De cá, os galhos de árvores não deixam nossa visão descrever com exatidão a altura e o andar de onde o corpo tombou. Uma manhã tranqüila demais, um policial ali na praça uma hora daquelas é raro de ver, ainda mais dando ouvidos a uma senhora que se exala de tanta atenção recebida e que, para aproveitar a oportunidade, detalha todas suas queixas.
Ah, está ai a explicação, que distração. O que se apresenta esparramado ao chão, a alguns passos dos dois personagens explica a cena não cotidiana. A cor vermelha e viscosa escorre por baixo do lençol branco em meio a rua, todos conhecem aquela cor em frente a banca de frutas que não estava presente naquele momento para testemunhar o som triste amortecido pelas poucas frutas largadas ao chão.
Talvez Maria, os seios são fartos, é uma Maria sim, o noticiário discorda e diz que é João, quem vai certificar as intimidades é o IML, mas a senhorinha chamava por ela, falava por ela, e com um carinho particular como para com ela.
Amava demais, essa é a causa, dizia a senhorinha. Todos morrem santos, ela ou ele ainda estava pecando, santo que pecou tem mais substância. Amava demais um menino, que amava demais a carne e não lhe amava mais, afinal ela era ele, é contra a natureza, e ele já sabia o que era ser homem. Ela também sabia o que era ser homem, tanto que não suportava e resolveu ser ela, e gostou! E ele menino também gostou de ter ela, e assim ser ele, o homem.
Amava de menos, essa sim é a causa. Todos dizem que houve discussão, ninguém diz qual, e sabemos o fim, e o que todos ouviram com certeza foi a queda.
Na Praça Roosevelt agora é silêncio, ninguém lembra do nome dela ou dele, somente o som oco do corpo ao cair, e que o corpo tinha seios fartos, que o motivo era amar demais e que pecava.
Já na Praça Buenos Aires, outro corpo cai, e esse era pleno, era ela, o senhorzinho tinha certeza, essa era ela, é aquela da novela, não tinha oco, só tinha pena, pois era santa.

O Livramentense

1 Comments:

At 7:51 PM, Anonymous Anônimo said...

Previamente aprovado.

paGU.

 

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